Projetar é Escutar

Projetar é Escutar

Por Edo Rocha

No silêncio entre uma linha e outra de um croqui, existe uma escuta.
Escuta do entorno, da técnica, das impossibilidades e — principalmente — das pessoas.
Projetar um estádio urbano como o Allianz Parque não é apenas desenhar para um espetáculo: é desenhar com consciência da cidade que pulsa ao redor dele.

Quando iniciamos esse projeto, sabíamos que a missão não era simples. Tratava-se de redesenhar um símbolo: o antigo Estádio Palestra Itália. Mais do que erguer uma nova estrutura, precisávamos honrar uma memória coletiva e, ao mesmo tempo, preparar esse espaço para o futuro. Um futuro em que o futebol divide o palco com a música, com eventos corporativos, com a vida cultural de uma metrópole em movimento constante.

A arena e o desafio do som

Uma arena multiuso, localizada em área densamente habitada, exige um cuidado especial com a acústica — não só para garantir qualidade de som interna, mas também para reduzir ao máximo o impacto sonoro externo.

Para isso, implementamos um sistema de fachadas com elementos metálicos perfurados, com dimensões e distanciamentos cuidadosamente calculados, inspirados inclusive na proporção áurea. Mas o elemento vazado não atua sozinho. Ele funciona como parte de um sistema de controle acústico em camadas, que inclui materiais fonoabsorventes, revestimentos técnicos e o redirecionamento de ondas sonoras. O objetivo? Difundir, absorver e atenuar — não isolar completamente, o que seria tecnicamente inviável em um espaço aberto e de grandes dimensões.

Quando o projeto é maior que o arquiteto

Receber mais de 140 mil visualizações em um vídeo técnico sobre esse tema foi uma surpresa — e um sinal claro de que a arquitetura, quando compartilhada com transparência, dialoga com todos os públicos. Nos comentários, vimos de tudo: palmas entusiasmadas, críticas legítimas, perguntas técnicas, humor, provocações e — o mais bonito — curiosidade genuína.

Sim, houve falhas.
Nem tudo é perfeito em uma obra dessa escala.
Mas arquitetura é também assumir o inacabado, o que pode ser aprimorado. É entender que toda obra carrega seu tempo, suas contingências, seus ajustes finos ao longo da vida útil.

Técnica com alma

Projetar é alinhar engenharias, escutar especialistas, entender as normas…
Mas também é sentir o impacto do primeiro visitante ao olhar para cima, admirado com a grandeza de uma estrutura que respira simplicidade e complexidade ao mesmo tempo.
É ouvir de um morador vizinho: “Eu não sabia por que me incomodava o som… agora faz sentido.”
Ou de um arquiteto: “Passei por ali, não torço para o clube, mas parei. Fiquei admirando.”

É para essas pessoas que a arquitetura precisa continuar respondendo.

O som do futuro

Não há projeto infalível, mas há projetos que se abrem à escuta.
O Allianz Parque é um desses.
E isso não é apenas mérito de materiais ou cálculos — é mérito de uma direção.
De uma ideia que persiste mesmo diante do ruído.

Seguimos projetando.
Seguimos escutando.


Edo Rocha Arquiteturas
Pensar grande é ouvir o detalhe.
📍 São Paulo, SP